Monday, March 12, 2007

14º Encontro

Sábado, 10/03/2007, a roda de leitura foi de textos autorais. Os participantes que trouxeram seus textos leram em seqüência lúdica. Outros apareceram apenas para ver, ouvir e apreciar.

Entre um texto e outro, tivemos também algumas histórias de viagens relatadas pelo poeta Ítalo Rovere.

Sempre deixamos a primeira leitura para os novatos. E nesse dia, contamos com o estreante Guilherme Linhares cujos textos iniciaram a roda, com os demais autores apresentando-se em seguida:


1. Marília leu o texto de Guilherme: (RE) (DES) ENCONTROS

2. Guilherme e Lara leram HORIZONTE, o 2º texto de Guilherme

3. Ítalo leu e interpretou o seu TATO AMARELO, que além de poesia é também cores e imagens, cada estrofe é uma página ilustrada do livreto. Aqui reproduziremos apenas o texto. As imagens ficarão para os curiosos buscarem com o autor...

4. Levi trouxe e leu 3 de seus poemas: A CIDADE; DE TEMPOS EM TEMPOS e AMORES URBANOS

5. Aníbal trouxe uma prosa - A MENINA VIROU MULHER - inspirada numa experiência pessoal, narrada antes de iniciar a leitura.

6. Marília leu o texto PREFÁCIO, de sua autoria, fazendo-a ainda mais transparente perante todos nós.

7. Encerrando a roda, Bruno trouxe o texto ELE NÃO SABE TOMAR SORVETE, de sua autoria.

Nos posts abaixo, seguem alguns textos apresentados.

Saturday, March 10, 2007

Tato amarelo

De: Ítalo Rovery
Quem leu: o próprio












De: _________
Para: ________
Para mudar o mundo o amor de todo mundo

TATO AMARELO
ítalo Rovere

Tudo isso
foi no escuro
da noite

para quê refletores?
Vamos fazer a nossa própria luz

Teu calor
Teu jeito
Concentrado
Disfarçado

chamou-me a atenção

Fui embora
e nem te disse
que fui embora

Eu fui embora!
Por que? Não sei!

Não quero pensar que fui embora
Prefiro pensar em te encontrar nova(mente)

Ver-te
Falar contigo

Como se tu
me conhecesses
de antes
de beijar minha boca

E ao meu ouvido tivesses dito
O meu olhar viu o teu

Eu te vi
Tu me viste
Tu me fazer ver
Tu és o amor

ADEUS

Estou partindo em pedaços
Porque não sei quem és tu

Eu te via
Tu me vias?
Eu não sei

Senti-me
Visto por ti

Coloquei a máscara da minha nudez
Estava com os pés em cima do risco

Tu és a pureza
Tu és a beleza

MAGIA

Teu tato
vai ficar gravado
feito gramática
sei lá

Foi só um relâmpago
em uma noite
perdida
do tempo

No meio
da multidão
absorvida
pelo barulho
das vozes e do som

Subi
ao céu
sozinho

Por que
não vens
até aqui

No meu coração?

Eu
te
sinto

O teu tato é amarelo assim como o sol
Se for falar do teu brilho
Então nem pensar

Porque não teria fim.

Te vendo

Não há
por que
saber
teu nome

É teu
o olhar
que olha
para o meu?

No meu coração
tua existência
faz-me feliz

Mesmo sem falares comigo
e sem saberes meu nome
vou continuar a ver-te

Como foi bom ver-te tão leve
Pensei que fosses me levar...

Qual é a tua cor?
Quero saber de ti...

Tua face
estava lavada
tinha brilho
tua pele
reluzia
luzia
luz
ia

Para onde ias?
Eu não te via
E te procurando
Vagava no teu mistério

Te
Vi

Te
Vi

Te
Vi

Esqueci de mim

Ali
Ali
Ali

Te
Vi
Te

Vi
Te
Vi

Tu estás onde não te esqueci

Não quero te esquecer
Vou te guardar.

A cidade

De: Levi Teixeira
Quem leu: o próprio

A cidade devora com tanta voracidade os meus dias,
que eu acho que ainda nem digeri minha infância.

Amores urbanos

De: Levi Teixeira
Quem leu:
o próprio

(a Fátima Muniz)

Os gritos,
urros,
gemidos de dor...
das cores da cidade grande
anunciam um fúnebre ritual
de mais um dia.

Enquanto uma voz doce, ultravioleta,
em meio a essas cores berrantes,
ecoa...
fluindo como gotas de poesia
nos meus ouvidos.

E essas palavras, a conta gota,
formam um grande oceano,
um belo poema,

onde mergulham meus sentidos
e afogam-se meus pensamentos,
até chegarem as profundezas:
o mais profundo silêncio...
dos meus sonhos.

De tempos em tempos

De: Levi Teixeira
Quem leu: o próprio

O dia ainda nem raiou,
mas o horizonte já exala suas nuvens de fumaça,
que se esvoaçam...
revelando, aos poucos, o brilho do metal adormecido.

E o tempo, aquele velho ferreiro,
inicia suas marteladas diárias.

Com o advento das metalúrgicas,
os poetas se perguntam:
- e agora onde estará o velho ferreiro?

Prefácio

De: Marília Passos
Quem leu: a própria

Não quero limites ou fronteiras, tentar sorrisos, ser conceitos. Dizer inteiro, sonhar tão pouco, dormir tampouco, quero ser brisa, quero silêncio, sem intento, verdades em partes, repartes comigo, sem seres abrigo, te peço um segundo e peco, um mundo, mas seja.

Que seja, eu seja, me beija, o agora demora: faça. Mas não faça, desfaça, pessoas troque, revolte, volte, toque, me veja, destrua, tão nua, se nua, tão seja.

Não quero o querer repetido, quero o início do que não veio, quero o abraço apertado não esperado, a palavra que em si surge, bonita. Se triste, que insiste,o insistir fato não mais, QUERO MAIS, QUERO MENOS.

Esperei o pôr-do-sol do domingo, tão lindo, ao teu lado, um encanto, tão tanto, o hoje, no entanto, é tamanho, sem limitações. Mão e luva, luva e mão, na canção, poesia; no meu dia, redenção. Amei a lua da semana, mas sempre um desencontro, certas coisas parece verei tão tarde, que invade, invade, não sei mais do querer.

Que mãe, quero mais, quero menos. Liberdade na ilusão, ilusão que em si não cabe, mas fale – cale -, declame, possessos leiamos, vivamos, sejamos, eu ao menos viver um tanto. Vir comigo querendo consigo, consigo outro céu outra lua outro sol outrossim, sem tu sem mim, sem eles: assim.

Pai, não é isso, tudo aquilo e nada disso, transbordo, transporto, transcendo, trazendo – um sempre – sorriso. Admiração, espanto, olhar o manto que parece encobrir. Encobrir o quê se tudo vago, até o fato, o fosco e o exato, o tanto O PARCO, vago, vaguidão: embriago, solidão.

Tantas coisas em minha cabeça, tantos tantos sem um lugar, tão lugares sem me saber e, me sabendo, o que fazer? Ai, que engano, tão vivo, meu tanto, meu sempre, meu sigo, AMIGO, por que vais? E, se vais, dorme cedo, é segredo, é paixão. Paixões não dormem cedo, É engano, dormem cedo e acordam cedo, um turbilhão, Juras, Precisas, Não.

Pensei, falei, provei, te dei, cantei, tomei, calei, mas calei porque calar é um canto-ponto. É uma aresta, como uma cesta e, se não me entendes, uma pena, já te quis de uma forma tamanha, Não mais, tu me perguntas, mas não te respondo, ao menos se digne a procurar uma resposta. Abra a porta, veja o que dizem, relute o que fazem, resista ao que tentam,

Não quero querer de velho, quero o novo, o estrondo, o sufoco, como um louco, um poeta, um possesso; o INVERSO de tudo e do verso; não me caibo, eu tão laico, quero TANTO. O querer que me liberta me sufoca, que escolha, quero todas. Vou viver, que a vida, não sendo isso, aquilo também não é.

Quero viajar e levar alguém no colo, quero um alguém que não seja mau, QUERO EU, quero quero, belo belo, será tenho tudo o que quero? E o Mestre não quero amar não quero ser amado, não quero combater não quero ser soldado: porque as leis não bastam, os lírios não nascem das leis.

Quero cada sorriso, quero cada criança ao cantar a esperança, quero a lágrima e a dança: poesia, teatro! Quero a exclamação, o diverso, cada linha, cada flor, cada vinha, cada amor. Quero a música o beijo, o silêncio o desejo, a ilusão! O sonho, o concreto, o etéreo, o bonito e o feio, o começo e o meio, desse jeito.

De outros jeitos, quero saber, dizer, perguntar: ajudar, ser bem simples, singular, complexo, sendo o caso, não ligo, ABSTRATO. Quero, sincero, inventado, criado, sozinho, derivado, original, animal, consciência: razão, plurivalência. Sentido, vivido, causado, sofrido, cessado, solvido, calado, sumido.

Quero o não-querer quando chorar faço. Se faço, um pecado, quero querer amar sem o efó, mas não posso, e é o que dói. Dói-me o limite, mas tento, INSISTE, quero mais, quero menos.

O infinito impreciso, escrever numa calçada, beijar o beijo que recebo sem ganhar, ganhar desejo que eu recebo sem falar.

Do infinito preciso, confesso, quero ler como um possesso – escrever, ainda mais - , quero tanto e quero tudo, só não quero é ficar mudo, desse jeito

Continuo.

Ele não sabe tomar sorvete

De: Bruno Reis
Quem leu: o próprio

Epílogo:

Ele não sabia tomar sorvete
Ele não chupa a bala que vende
Ele não sabe quanto é
Ele não sabe quanto

Tinha receio, sem precaução,
Ele não podia ter!
Cedia ao desejo, de olho aberto
Não se priva, mas se sacia com parcimônia*

*Ele não sabe o que é parcimônia
Ele não deve saber! Ele não pode!

Ele não devia estar tão exposto
Sozinho no banco
Com as pernas balançando
Enquanto não sabe tomar sorvete

*Ele não sabe se desconcertar
E isso é de desmontar qualquer um...

Porém, ninguém se desmontou


Prólogo:


‘’Me deixa, me deixa ver se eu caibo no teu desconforto...’’


Enfim:

Escrevi há pouco tempo esse verso, tentativa de captura lírica de um incomodo qualquer: a identificação morna que senti ao presenciar cena de embaraço, instante fugidio de um qualquer alguém. Instante fugidio e banal, e digo banal de ‘’banalidade’’ mesmo, não por banalização. Um engancho na palavra que não desce à boca, um segundo de hesitação que cala a segurança, e o corpo todo se desencontra. E o incômodo a que me refiro não foi o dela, foi o meu, maior ainda, ao lembrar que normalmente me sentiria sensibilizado, mas ao contrário, havia em mim apenas uma indiferença obscena e indecorosa. Tentei sublimar isso escrevendo um apelo a mim para que tentasse sentir o peso de ser o outro. Lirismo cínico esse o meu.

Pois bem, voltando ao começo, e usando o verso solto de gancho pro meio: hoje eu coube. Em outrem, e mais do que eu imaginava. Esperava que o desconforto alheio fosse menor que o meu, que eu ficasse ridículo feito um adulto com roupa que encolheu, a calça virando bermuda, enfiada no meio das pernas. Ou que a vestisse feito uma caixinha de pano e papel, deixando meus braços de fora. Mas não. Ele me coube inteiro. Inteiro e com vazios, como todo desconforto deve ser. Estava ali, dentro de uma caixa sem gravidade sendo chutada em uma partida de futebol em câmera lenta.

O cinismo desprevenido que joguei sobre os outros cai agora sobre mim com peso o opaco do sarcasmo. Sarcasmo da vida. A consciência da repetição não diminuiu o estranhamento vazio em nada. Não me coube indignação, revolta, tristeza. Apenas o sentimento de esquisitice extrapolando, me negando a encarar a normalidade quase boa de tudo. Nesse momento, o desconforto me comporta todo. Sou eu sentado como criança num banco alto, balançando as pernas no ar que mal se move, comendo um sorvete sem saber como. Sou eu me apropriando das cenas que vejo, repetindo meu exercício narcisista de inventar tristeza alheia para dar vazão àquelas que eu não me lembro. Não quero achar explicação. Não quero que o leitor me dê nenhuma. Um desconforto é só isso, um encerramento claustrofóbico. De que, em que? Não sei. Não é retiro espiritual, é retirada do espírito, confiscado. Por que? Por quem?

Não posso fazer o sacrilégio de dizer alguma coisa.